quarta-feira, 21 de março de 2007

Ó paí ó - O filme tem pré-estréia na Bahia


O filme Ó pai ó, que estréia na sexta-feira, 30 de março, tem tudo para ser um filme muito bom, mas deixa a desejar. O próprio título do filme tem um tom de denúncia, mas não denuncia o suficiente. A obra é adaptada de uma peça homônima, encenada pelo Bando de Teatro Olodum nos anos 90, mas quem assistiu garante que faltou muito para que a adaptação saísse perfeita.
A campanha de marketing foi sensacional, com direito a trio elétrico temático no carnaval da Bahia, música tema cantada por Caetano Veloso e Jauperi, lançamento na Concha Acústica e muito mais. A trilha sonora do filme tem, realmente, a cara da Bahia, o elenco é composto por grandes artistas – a maioria baianos – e todo o filme é ambientado em uma cultura riquíssima. A idéia é retratar o dia-a-dia dos moradores do Pelourinho e mostrar o que não se vê em cartões postais, mas a história deixa muito a desejar.

O enredo acontece no primeiro dia do carnaval da Bahia. Os moradores de um cortiço localizado na Barroquinha, logo abaixo do Pelourinho, descobrem que a dona do estabelecimento, tentando acabar com a festa de todos, resolveu fechar o registro de água. Entre a falta de dinheiro e a vontade de se divertir eles se viram às custas de muita criatividade e animação.
O filme tenta unir um viés político e social, aliado a muito humor. Na parte de política o que pude perceber foi personagens lendo o Correio da Bahia e a ressalva de que ACM, o próprio, significava (pasmem!) Ação, Competência e moralidade. O quê? isso mesmo, eu ouvi no filme... Vale ressaltar que, pelo menos em Salvador, a pré-estréia teve o apoio da Rede Bahia (Empresa de Antônio Carlos Magalhães). O lado social é retratado com muito mais verdade. Apesar de ter sentido falta de personagens menos caricaturados.

A direção é de Monique Gardenberg- talentosa, dirigiu grandes filmes como Benjamim e Jenipapo, produziu grandes shows, fez mais de 15 videoclipes - baiana de nascimento, mas não de alma. Segundo a cineasta, radicada no Rio de Janeiro, a realidade do filme está retratada de forma bastante próxima à realidade porque o filme “aborda pessoas do povo, de origem humilde e, portanto, pretas” (Como assim? Eu, como boa baiana e brasileira de coração, prefiro acreditar que a Bahia é “a terra do branco mulato e do preto doutor”) e toda a sua vitalidade, sensualidade, musicalidade. Ela afirma ainda que foi atraída por “uma Bahia negra, pobre, que resiste por meio da música, da libido, da fibra e vitalidade. Uma Bahia e um Brasil que resistem, mas sem perder a ternura. A índole dos personagens é para a alegria. Foi o que me encantou” disse Gardenberg em entrevista.
Foi o que a encantou e o que me decepcionou. A índole do baiano não pode ser apenas para alegria. Vi muita gente da Bahia, mas senti falta de gente com a cara da Bahia. Do povo que vive na terra da felicidade, mas que conhece de perto o que é o sofrimento. No filme tem o cara que vende drogas, a crente, dona Joana (Luciana Souza), que não era crente de verdade, os filhos da crente que tinham nome de Santos católicos – São Cosme e Damião – e furtavam nas ruas, a baiana gostosa que foi para França em busca de um marido rico e voltou sem nada, a mãe de Santo que era uma farsa, o taxista que falsificou a faixa do carro para não comprar a placa. Queria ter visto muito mais.

Mas, claro, tem muita coisa boa. O humor está presente em todos os momentos, o dialeto gostoso do povo da Bahia. O melhor do filme é, sem dúvida, a passagem em que Boca (Wagner Moura), tenta agredir Roque (Lázaro Ramos) o chamando de negro. Em um discurso veemente, inteligente e sensacional Roque diz que negro também tem sentimento, desejo, que também sofre quando toma um tiro, que também sente dor quando apanha, que negros e brancos são iguais em tudo e que ali, naquele momento, seriam iguais também. Na Concha, a emocionante cena foi aplaudida de pé pelos cinco mil convidados presentes. Outra cena de muito emoção foi a dor da mãe, a dona Joana, quando perdeu seus filhos, por causa da violência, e da ignorância, urbana. Excelente representação, digna de prêmio.
Assistir o filme é uma experiência riquíssima e bastante divertida, mas é preciso um olhar crítico para que a gente – e o mundo – não se convença de que a Bahia só tem aquilo para mostrar.
A pré-estréia na Concha
Sensacional assistir a pré-estréia do filme na Concha Acústica (ao lado do meu amor – no dia nosso aniversário de namoro) e depois ainda curtir o show de experiência de Caetano e Jauperi, o lado cantor e a simpatia de Lázaro Ramos, a presença de palco e a voz maravilhosa de Marienne de Castro, o charme e o vozeirão de Margareth Menezes, a baianidade do grupo Olodum, a participação de Emanuelle Araújo, entre outros. Valeu a pena!